O compositor Paulo César Pinheiro não consegue nem faz questão de explicar direito, em prosa, de onde vem sua capacidade de criação, e diz: "A música me ama, ela me deixa fazê-la. A música é uma estrela, deitada na minha cama. Ela me chega sem jeito, quase sem eu perceber. Quando me dou conta e vou ver, ela já entrou no meu peito. No que ela entra, a alma sai, fica meu corpo sem vida. Volta depois comovida, e eu nunca soube onde vai. Meu olho dana a brilhar. Meu dedo corre o papel, e a voz repete o cordel que se derrama do olhar. Fico algum tempo perdido até me recuperar, qua- se sem acreditar se tudo teve sentido. A música parte e eu desperto pro mundo cruel que aí está. Com medo de ela não mais voltar. Mas ela está sempre por perto. Nada que existe é mais forte, e eu quero aprender-lhe a medida de como compõe minha vida, que é para eu compor minha morte." (Do disco Parceria, gravado em 1994, com João Nogueira.) (Paulo Donizetti de Souza. Entrevista com Paulo César Pinheiro in Revista do Brasil , outubro de 2010, p. 33) É correto deduzir do texto que, para o compositor,
a) o ato de criação é inexplicável, pois em um mundo cheio de problemas, como o da crueldade humana, não é possível imaginar a harmonia sonora de uma canção.
b) a inspiração musical, por tratar-se de algo que vem do nada e de forma totalmente inesperada, acaba se traduzindo na total perda da identidade de seu criador.
c) a percepção de uma sensibilidade voltada para a criação musical está sempre associada ao estranhamento que envolve a previsibilidade da morte.
d) as músicas surgem em uma espécie de transe e brotam naturalmente, sem que ele possa exercer um maior controle sobre aquilo que cria.
e) a criação de músicas corresponde a uma ilusão praticamente sem sentido lógico, mesclada com o sofrimento físico que vem interromper seu sono.