Seria uma grande ilusão imaginar que a cada problema histórico corresponde um tipo único de documentos, específico para tal emprego. Quanto mais a pesquisa, ao contrário, se esforça por atingir os fatos profundos, menos lhe é permitido esperar a luz a não ser dos raios convergentes de testemunhos muito diversos em sua natureza. (...) Assim como o levantamento das crônicas ou dos documentos, nosso conhecimento das invasões germânicas depende da arqueologia funerária e do estudo dos nomes de lugares. À medida que nos aproximamos de nossa época, essas exigências tornam-se, sem dúvida, diferentes.
(...)
Ora, se quase todo problema humano importante pede assim o manejo de testemunhos de tipos opostos, é, ao contrário, de absoluta necessidade que as técnicas eruditas se distingam por tipos de testemunhos. O aprendizado de cada uma delas é longo; sua posse plena exige uma prática mais longa ainda e quase constante. Um número muito pequeno de trabalhadores (por exemplo), pode se vangloriar de estar bem preparado para ler e criticar um documento medieval; para interpretar corretamente os nomes de lugares (que são, antes de tudo, fatos de linguagem); para datar, sem erro, os vestígios do hábitat pré-histórico, celta, galo-romano; para analisar as associações vegetais de um prado, de uma charneca, de uma landa. Sem tudo isso porém, como pretender escrever a história da ocupação do solo? Poucas ciências, creio, são obrigadas a usar, simultaneamente, tantas ferramentas distintas. É que os fatos humanos são mais complexos que quaisquer outros. É que o homem se situa na ponta extrema da natureza.
(Marc Bloch. Apologia da História, Trad. São Paulo: ?ahar, 2001, p. 80-81)
A análise do texto permite inferir que, para o autor, o historiador
I. deve auxiliar-se, para interrogar os documentos, de outras disciplinas como, por exemplo, a arqueologia, a antropologia, a geografia, a economia, a linguística e é indispensável que ele possua ao menos um verniz de todas as principais técnicas de seu ofício.
II. deve pensar a história como narrativa e, como consequência, o que interessa a ele em sua pesquisa são os grandes fatos, a nação, uma história diplomática, ou seja, uma forma de fazer história que esteja intimamente ligada aos eventos políticos e às mudanças que trazem sempre algo de novo e melhor.
III. deve ver nos relatos dos documentos e apenas nos documentos oficiais (dos governos, da Igreja ou dos militares), a possibilidade de uma investigação histórica "científica", à procura de uma "certeza" para saber "reconstruir os fatos históricos" de uma sociedade.
IV. não deve ignorar, na sua leitura, a imensa massa dos testemunhos não escritos e aqueles da arqueologia em particular. Deve, também, se resignar a não poder compreender tudo do passado, a utilizar um conhecimento por meio de pistas, a recorrer a procedimentos de reconstrução, dos quais todas as ciências oferecem inúmeros exemplos.
Está correto o que se afirma SOMENTE em