AUTOR – Eu sou o autor de uma mulher que inventei e a quem dei o nome de Ângela Pralini. Eu vivia bem com ela. Mas ela começou a me inquietar e vi que eu tinha de novo que assumir o papel de escritor para colocar Ângela em palavras porque só então posso me comunicar com ela.
Eu escrevo um livro e Ângela outro: tirei de ambos o supérfluo.
Eu escrevo à meia-noite porque sou escuro. Ângela escreve de dia porque é quase sempre luz alegre.
Este é um livro de não memórias. Passa-se agora mesmo, não importa quando foi ou é ou será esse agora mesmo.
(…)
ÂNGELA – Viver me deixa trêmula.
AUTOR – A mim também a vida me faz estremecer.
ÂNGELA – Estou ansiosa e aflita.
AUTOR – Vejo que Ângela não sabe como começar. Nascer é difícil. Aconselho-a a falar mais facilmente sobre fatos? Vou ensiná-la a começar pelo meio. Ela tem que deixar de ser tão hesitante porque senão vai ser um livro todo trêmulo, uma gota d’água pendurada quase a cair e quando cai divide-se em estilhaços de pequenas gotas espalhadas. Coragem, Ângela, comece sem ligar para nada.
(Clarice Lispector. Um sopro de vida)
A leitura do texto permite concluir que se trata de uma
a) exposição objetiva, ou seja, aquela em que o narrador deixa prevalecer a racionalidade, sem mostrar-se subjetivamente.
b) autobiografia, ou seja, aquela em que o narrador revela momentos de sua vida e os analisa com imparcialidade.
c) reminiscência, ou seja, aquela lembrança vaga que desperta sentimentos do narrador, até então desconhecidos.
d) metanarrativa, ou seja, aquela em que o narrador explicita e questiona o próprio processo de criação do enredo.
e) narração impressionista, ou seja, aquela que carrega elementos objetivos sem intenção de explorar possíveis sentimentos das personagens.